LÍVIA DRUSILA – ESPOSA, MÃE, AVÓ E BISAVÓ DE IMPERADORES ROMANOS

Em 30 de janeiro de 58 A.C., nasceu, em Roma, Livia Drusilla (Lívia), filha do senador romano Marco Lívio Druso Claudiano e de sua esposa Aufídia.

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O nome de nascença do pai de Lívia era Ápio Cláudio Pulcher, mas, por circunstâncias cujo conhecimento se perdeu, ele foi adotado pelo Tribuno da Plebe Marco Lívio Druso, recebendo, assim, o nome do pai adotivo, adicionado do cognome “Claudiano“, para indicar sua ascendência sanguínea. Portanto, Lívia e seu  pai, eram, segundo o historiador romano Suetônio, descendentes diretos do célebre Cônsul, Censor e Ditador da República Romana, Ápio Cláudio Ceco, que, entre outros feitos, construiu a Via Ápia, em 312 A.C. sendo, assim, integrantes de uma das mais ilustres famílias da aristocracia romana.

Já a mãe de Lívia, Aufidia, era filha de Aufídio Lurco, originário de uma família plebéia da cidade latina de Fundi e que conseguiu ser eleito Tribuno da Plebe em 61 A.C. Como curiosidade, consta que Aufídio foi o primeiro a criar e vender pavões para abate em Roma, enriquecendo em função disso (a carne de pavão,  sobretudo as línguas dessa ave, tinham se tornado uma iguaria da alta gastronomia romana).

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Aproximadamente entre 43 A.C e 42 A.C, Lívia casou-se com seu primo Tibério Cláudio Nero, que havia servido como questor e lutado ao lado de Júlio César. Os recém-casados, já em 42 A.C, tiveram um filho, que recebeu o mesmo nome do pai e que futuramente se tornaria o segundo imperador romano, Tibério.

Contudo, durante a Guerra Civil que se seguiu ao assassinato de Júlio César, tanto Marco Lívio Druso quanto Tibério (pai) escolheram o lado de Bruto e Cássio, os líderes da conspiração senatorial para assassinar o Ditador. O pai de Lívia, inclusive, chegou a lutar na Batalha de Fílipos e, da mesma forma que os referidos conspiradores, ele também cometeu suicídio quando as tropas dos auto-entitulados “Libertadores” foram derrotadas pelas forças de Marco Antônio e Otaviano, que se tornaria mais tarde o futuro imperador Augusto.

Ao começarem as perseguições políticas, proscrições e confiscos movidos pelos Triúnviros Antônio, Otaviano e Lépido contra os inimigos políticos do Segundo Triunvirato, o aflito Tibério Cláudio Nero e Lìvia, tiveram que fugir de Roma, em 40 A.C., levando com eles o bebê Tibério, de apenas 2 anos, indo juntar-se a Sexto Pompeu, na Sicília, filho do falecido Pompeu Magno, que prosseguia a guerra movida pelos partidários da supremacia nobreza senatorial contra o Triunvirato. Entretanto, após assinarem uma trégua com Sexto Pompeu, os Triúnviros resolveram anistiar os seus opositores, e Lívia e seu marido puderam voltar para a Roma, em 39 A.C.

E foi naquele ano de 39 A.C, já em Roma, que a jovem matrona Lívia, em certo evento social, foi apresentada a Otaviano, o jovem Triúnviro e herdeiro de César. Ela tinha, na ocasião, apenas 19 anos de idade, mas já estava grávida do segundo filho, que se chamaria Druso. Por sua vez, o jovem Otaviano, um jovem de 24 anos, já estava no segundo casamento, com Escribônia, cinco anos mais velha do que ele e também grávida da única descendente que ele teria durante toda a sua vida, a sua filha Júlia, “a Velha” (assim chamada para distingui-la de outras homônimas posteriores. Cuidado para não confundi-la, com uma outra Júlia, filha de César).

Vale observar que o casamento de Otaviano e Escribônia decorreu de um arranjo político entre o Segundo Triunvirato e Sexto Pompeu, pois Escribônia era irmã da esposa do segundo.

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O fato é que, de acordo com as fontes, no citado encontro Otaviano apaixonou-se à primeira vista por Lívia, não nos surpreendendo que ele tenha se sentido atraído por uma jovem cujos retratos existentes denotam de fato uma beleza suave e serena, além de um porte aristocrático.

Assim, não passou  muito tempr para que, ainda em 39 A.C, Otaviano se divorciasse de Escribônia. Apesar do público certamente saber que a união entre ambos fora um casamento arranjado, não deve ter deixado de causar algum rebuliço na sociedade romana o fato de o divórcio ter sido oficializado no mesmo dia em que Escribônia deu a luz à Júlia (30 de outubro de 39 A.C.)!

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(Busto de Júlia, “a Velha”, filha de Otaviano (Augusto) e Escribônia, foto de Miguel Hermoso Cuesta)

Concomitantemente, Tibério Cláudio Nero foi “convencido” a se divorciar de Lívia, mas tudo indica que não deve ter havido qualquer contrariedade da parte dos cônjuges…

Com efeito, constatou-se que Tibério Cláudio aceitou o divórcio com resignação e ele até deve ter vislumbrado a possibilidade de obter alguma vantagem pessoal com o desenlace. Por sua vez, é altamente provável que Lívia tenha se sentido também atraída por Otaviano, afinal, este tinha quase a metade da idade de Tibério (que tinha 46 anos), uma boa aparência e, naquele momento, ele já era, juntamente com seu colega de Triunvirato, Marco Antônio, o homem mais poderoso de Roma.

Vale notar que Lívia, quando se divorciou de Tibério Cláudio, estava grávida de seis meses do seu segundo filho, Druso.

Mas, certamente, além da paixão que Otaviano sentia por Lívia, a escolha dele também deve ter levado em consideração o prestígio da gens Cláudia, uma das famílias patrícias mais tradicionais de Roma.

Há uma tese, inclusive baseada em indícios de alguns problemas de saúde aparentemente hereditários que Druso sofria, que ele na verdade poderia ser filho de Otaviano, um fato que teria sido convenientemente ocultado pelos seus biógrafos para não comprometer a reputação de homem de conduta moral ilibada que o futuro Augusto sempre procurou cultivar em público,  passível de ser manchada pelo que constituiria um adultério de Lívia (muito embora ele mesmo notoriamente tenha tido casos com várias matronas romanas).

Então, em 17 de janeiro de 38 A.C, três dias após o nascimento de Druso, Otaviano e Lívia se casaram.

O casamento de Otaviano e Lívia duraria 51 anos,  terminando com a morte de Otaviano, então já chamado de Augusto, em 14 D.C., que já passava dos 75 anos de idade. Não obstante a longa duração desta união, Lívia somente engravidou uma vez de Augusto. Porém, infelizmente, o bebê nasceu prematuro e não resistiu ao parto. Os dois nunca mais tiveram outros filhos.

Em uma sociedade extremamente patriarcal como Roma, Lívia conseguiu ser influente e ter voz nos assuntos de Estado, servindo virtualmente como conselheira privada de Augusto. Em 35 A.C, ela recebeu o incomum direito de administrar o próprio vasto patrimônio sem necessidade de um tutor ou da concordância do marido (outorga uxória).

Lívia também teve estátuas erguidas e moedas cunhadas em sua homenagem, uma honra que até então era exclusiva de pessoas do sexo masculino.

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(Dupondius (moeda romana), de Lívia)

No plano político, Lívia representou a síntese das virtudes matronais que Augusto pretendeu fomentar na sociedade romana, já que ela era, reconhecidamente, uma mulher de dignidade e castidade quase lendárias (vale dizer que os historiadores do reinado de Augusto, como Suetônio, pródigos em relatos da vida sexual do círculo imperial, nada relataram, nesse sentido, quanto à Lívia).

Da mesma forma, Lívia sabia a importância que seu papel de esposa-modelo tinha no Principado inaugurado por Augusto: Consta que, certa vez, perguntada sobre o que tinha feito para ter tamanha e decisiva influência sobre o Imperador, ela teria respondido, com perspicácia e até uma ponta de sarcasmo (quem sabe talvez uma alfinetada no marido):

“Que isso era devido ao fato de ser ela mesmo escrupulosamente casta, fazendo tudo que fosse motivo de agrado para ele; não se metendo em seus assuntos; e,  particularmente, por não ouvir e não notar nada acerca das favoritas que foram objeto das paixões dele”.

Com efeito, apesar de interpretar publicamente o seu papel de boa esposa com maestria, é evidente que Lívia tinha muita influência no governo do marido e também manobrou, com sucesso, para tornar seu filho Tibério o herdeiro e sucessor de Augusto. Nesse ponto, a biografia de Otaviano e Lívia torna-se um tanto sombria, quase como uma espécie de “Madastra Má”.

Assim, muitos historiadores atribuem a Lívia o exílio do neto de Augusto, Agripa Póstumo, e as mortes do sobrinho e de outros dois netos dele e potenciais herdeiros: Marcelo, Caio César e Lúcio César, que estavam no caminho de Tibério para o Trono e morreram todos jovens.

Quando Augusto morreu e seu filho adotivo Tibério sucedeu-o, houve rumores de que Lívia teria envenenado o velho imperador, mas é muito mais provável que Augusto tenha morrido de velhice.

Lívia, que passou a ser  oficialmente chamada de “Júlia Augusta”, durante um bom tempo foi tratada pela opinião pública como co-governante e igual a Tibério (ela até recebia embaixadores de nações estrangeiras), algo que muito desagradou o novo imperador, que, incomodado, retirou algumas das prerrogativas que o Senado quis conceder a ela. Devido a esses fatos e às seguidas interferências de Lívia no governo que se iniciava, Tibério, progressivamente, afastou-se da mãe, que agia como uma poderosa “dowager” (expressão inglesa que significa a rainha-mãe ou imperatriz viúva que permanece com influência no reino).

Como se não bastasse tudo isso, pendeu sobre Lívia a suspeita dela ter sido a mentora da morte por suposto envenenamento do adorado general Germânico, o sobrinho de Tibério que Augusto exigira que fosse adotado pelo tio como sucessor.

Germânico morreu no ano de 19 D.C e houve um inquérito que resultou na prisão do governador da Síria, Pisão, como principal suspeito, tendo como comparsa sua esposa Munatia Plancina, grande amiga de Lívia. O historiador romano Tácito inclina-se pela tese de que a morte de Pisão, que alegadamente teria se suicidado no cárcere, enquanto aguardava o seu julgamento, teria sido uma conveniente queima de arquivo, e o historiador parece dar crédito à versão de que a morte de Germânico foi tramada por Lívia, que inclusive teria intervindo para absolver Plancina.

Em 28 de setembro de 29 D.C, Lívia Drusila morreu com a avançada idade de 86 anos. Consta que Tibério, que então vivia  afastado da Corte em sua fabulosa Villa Jovis, em Capri, não foi ao velório da mãe, embora a cremação tenha sido retardada vários dias pelos cortesãos que esperavam a sua chegada, até que a decomposição natural do cadáver obrigou aos responsáveis pelo funeral a acender a pira.

Além disso, Tibério não permitiu que diversas honras públicas e homenagens fossem conferidas à mãe. Foi somente no reinado do imperador Cláudio, neto de Lívia, que as honras dela foram restauradas, e realizada a sua deificação, em 42 D.C.

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(Estátua de Lívia, trazendo a cornucópia da abundância, provavelmente ligada ao seu culto)

CONCLUSÃO

Ilustra a impressionante trajetória de Lívia, o fato de que, quando ela nasceu, Júlio César ainda não tinha conquistado a Gália e a República Romana ainda era de direito um regime comandado pelo Senado e pelos magistrados eleitos.

Assim, Lívia foi: esposa do primeiro imperador, mãe do segundo, bisavó do terceiro, avó do quarto (Cláudio, que a deificou) e tataravó do quinto e último imperador da dinastia dos Júlio-Cláudios (Nero), uma dinastia que, portanto, poderia muito bem ser chamada de “Liviana“…

O imperador Calígula, bisneto de Lívia, referia-se à bisavó como “Odisseu de saias“, comparando-a ao mitológico herói Ulisses, em termos de astúcia e dissimulação.

FIM

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