ROMA E SEUS MUROS

Os muros voltaram!

Em pleno século XXI, governantes voltam a investir na construção de barreiras, sejam cercas ou muros.

Nos Estados Unidos, o polêmico e contestado Presidente Trump elegeu-se tendo com uma de suas promessas a construção de um muro na fronteira dos Estados Unidos com o México; Israel constrói muros separando o país e o território controlado pela Autoridade Palestina; e na Hungria, o governo construiu uma cerca na fronteira sul do país para impedir a entrada de refugiados  vindos do Oriente Médio…

 

A construção de barreiras contra inimigos, reais ou ilusórios, é uma medida recorrente na história dos povos através dos tempos, com maior ou menor sucesso.

Quase todas as cidades do Velho Mundo, e até mesmo do Novo Mundo, tiveram muralhas. Com efeito, até o século XIX, elas faziam parte da paisagem urbana européia: é verdade que Londres, a precursora, derrubou as suas por volta de 1760, mas as de Viena duraram até 1857. Paris as teve até 1860, e Madri, até 1868.

Em Roma, as primeiras muralhas teriam sido construídas pelo seu sexto rei, Sérvio Túlio, que reinou de 575 a 535 A.C. Essas muralhas provavelmente foram destruídas ou abandonadas durante o domínio etrusco, sendo que, após a invasão gaulesa e o saque de Roma, em 390 A.C, foram levantados novos muros.

Entretanto, durante a sua longa História, os soldados romanos, normalmente, estiveram muito mais acostumados a estarem do lado de fora das muralhas citadinas, na posição de atacantes, tentando ultrapassá-las para conquistar uma cidade inimiga cercada, do que guarnecendo muros.

Com efeito, uma das mais importantes condecorações militares romanas era a “corona muralis” – uma coroa de ouro com o formato de um muro que era concedida ao primeiro soldado romano que conseguisse galgar uma muralha.

Em verdade, impérios em expansão, por razões óbvias, não necessitam, de muralhas…

Assim, após a implantação da “pax romana”, quando Roma dominou todo o Mediterrâneo e não tinha inimigos à altura, as cidades romanas passaram a negligenciar o reparo e a construção de muralhas, chegando muitas a desmoronarem ou terem o seu perímetro ultrapassado pela expansão urbana, sem que novas fossem edificadas.

Somente após a derrota das legiões de Varo, na Germânia, que significou o abandono do projeto de incorporação daquele território e de expansão romana além do Reno, sentiu-se a necessidade de se estabelecer uma linha de fortificações, torres de vigilânciae paliçadas para prevenir incursões dos bárbaros germânicos, o “limes germanicus”, que, porém, nunca chegou a ser uma muralha continua de alvenaria, em sentido literal.

Da mesma forma, depois de invadirem a Grã-Bretanha, os romanos perceberam que os custos econômicos e militares de uma expansão até ao norte da ilha também não se justificavam, face a resistência das tribos dos Pictos e Escotos, antepassados dos escoceses. Então, o imperador romano Adriano, que era avesso à política expansionista de seu antecessor Trajano, construiu a primeira muralha fronteiriça contínua de Roma, a chamada “Muralha de Adriano”, no século II D.C.

 

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Porém, mais do que uma estrutura defensiva, a Muralha de Adriano era uma declaração política e uma exibição de poder. Com efeito, além de significar que a expansão romana terminava ali naquele lugar, pela vontade do imperador, ela servia também como propaganda da divisão do mundo entre civilização e barbárie: e de fato, estudos mostram que a muralha era coberta de argamassa caiada de branco, para parecer mais vistosa e impressionante para os bárbaros do outro lado.

Para muitos estudiosos militares, as muralhas, entretanto, são uma declaração de fraqueza: nações poderosas não precisam de muralhas, pois seus exércitos são poderosos e temidos o suficiente para intimidar e derrotar os seus vizinhos, invadindo o território inimigo quando for necessário.

Quando o Império Romano passou a ser alvo frequente das invasões germânicas, em meados do século III D.C, as muralhas voltaram à moda: Por todo o Império, as cidades começaram a reparar os seus muros ou a construir novas muralhas.

A própria Roma não escapou. Após a invasão dos Vândalos, que saquearam a cidade de Placência, no norte da Itália, o imperador Aureliano ordenou a construção na capotando Império das impressionantes muralhas que levam o seu nome, com 19 km de extensão, construídas entre 271 e 275 D.C.

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Reforça a tese dos especialistas antipáticos à estratégia militar baseada em muralhas, o fato de que, durante toda a existência das suas muralhas anteriores, ditas Servianas, a cidade de Roma passou 800 anos sem ser invadida por inimigos estrangeiros. Contudo, apenas 140 anos após a construção das Muralhas Aurelianas, Roma foi invadida e saqueada pelos Godos, em 410 D.C.  E, apenas 45 anos depois disso, a Cidade Eterna seria saqueada, ainda mais brutalmente, pelos Vândalos, 455 D.C.

Por outro lado, agora como um caso de sucesso de uma muralha, a nova capital do Império, Constantinopla, que, em 405 D.C recebeu as formidáveis Muralhas Teodosianas, resistiu por mais de mil anos ao cerco dos mais variados inimigos, somente vindo a cair em 1453 D.C, quando os Turcos empregaram os mais poderosos canhões da época (a cidade foi conquistada antes pelos cruzados, em 1204, mas eles tiveram auxílio de opositores internos).

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Enquanto isso, no moribundo Império do Ocidente, começava uma tendência que se acentuaria na Idade Média: a população civil circunvizinha, para se proteger, se mudou para quartéis militares fortificados (castra), para pequenos fortes militares (castellum) ou para pequenos povoados situados em colinas e morros (oppidae). Com a Queda do Império, essas posições fortificadas, agora ocupadas principalmente pelos nobres germânicos vitoriosos, passaram a ser a controlar as terras e a população rural vizinhas, dando origem aos onipresentes castelos que dominaram a paisagem européia medieval.

No século XX, entretanto, o conceito de estratégia militar baseada em muralhas recebeu dois grandes baques: a) a humilhante inutilidade da “Linha Maginot”, contornada com facilidade pelo exército alemão na 2º Guerra Mundial; e b) a queda do “Muro de Berlim”, abatido a golpes de picareta pelos próprios cidadãos da Alemanha Oriental.

Agora, em nossos próprios dias, em pleno século XXI, novamente países levantam barreiras tentando evitar a entrada de grupos de forasteiros indesejados, uma medida criticada por muitos especialistas.

E você, leitor, o que acha das muralhas?